Adriano Goldschmied aborda impacto do coronavírus no denim mundial

Adriano Goldschmied aborda impacto do coronavírus no denim mundial

Adriano Goldschmied aborda impacto do coronavírus no denim mundial

A criação e o desenvolvimento do jeans é um ato de atenção que vai além do planejamento. Envolve toque, experiência e manipulação da peça em linha de produção. Manter essa atividade por trabalho remoto, privando-se do contato social é um imenso desafio para qualquer designer. E não o deixa de ser também para os grandes mestres do setor, como Adriano Goldschmied, cujo método de trabalho sempre se fundamentou no contato físico com a peça em desenvolvimento.

Em entrevista concedida no Instagram ao empresário Sandeep Agarval, fundador da feira de negócios de moda Denim and Jeans, Adriano contou como tem enfrentado a crise imposta pelo Covid-19, o novo coronavírus. O desafio de digitalizar seu método de trabalho, a visão de como o momento vai afetar o mercado denim global, a previsão de como vai ser a retomada ao consumo e as adaptações criadas pela necessidade do momento sem precedentes que estamos vivendo foram questões abordadas.

Desde 1996, o designer italiano divide seu tempo de trabalho entre Milão, Itália e Los Angeles Califórnia. Sendo este último, o local onde está seu escritório, em casa e onde está permanecendo neste momento de isolamento social. De acordo com Adriano, a região não está com problemas tão sérios quanto Nova Iorque, principal foco da doença nos Estados Unidos, mas também inspira cautela. “Todos os negócios estão fechados exceto os essenciais, mas as pessoas estão pela rua e isto não é bom”, opina.

De acordo com ele, apesar do governo da Califórnia sugerir que as pessoas ficassem em casa, “o espirito livre dos americanos os inspira a sair pelas ruas e continuar suas vidas fazendo o que tem que fazer”. A afirmação contextualiza uma condicionante cultural que tem dificultado a contenção do vírus no país norte-americano.

Abordando suas próprias dificuldades, Adriano compartilha que não faz parte de uma geração digital, por isso a exigência de trabalhar a distância tem sido mais difícil para ele. “Pessoalmente para mim, a digitalização é algo que só estou fazendo agora, pois eu tenho um método de trabalho muito atrelado ao contato muito físico com as pessoas e com  meu trabalho, estou sempre tocando os tecidos e sentindo suas características, conferindo o fit”, explica .

Segundo Adriano, a falta do contato físico praticamente inviabiliza seu método de trabalho habitual. “Criar nestas condições seguramente é muito difícil: precisamos do contato físico, mas nesse momento estamos sendo mais reticentes e tentando colocar a maior parte das pessoas conectadas”, explicou.

Perguntado sobre como a situação imposta pelo Covid-19 impactaria a moda, em especial o segmento denim mundial, o designer foi realista. “Meu ponto de vista é de que não entendemos a dimensão deste desastre”, explica. “Nós sabemos, pois todos sabem o que está acontecendo. As companhias estão fechadas, todos estão tentando fazer seu trabalho remoto e o seu melhor, mas acho que nós ainda não entendemos o tamanho das consequências desta situação para todos. As consequências deste momento serão longas”, completou.

Abordando as mudanças que serão decorrentes do novo coronavírus, Adriano afirma que moda circular, atenção maior à transparência e honestidade terão uma outra percepção, bem maior, de valor.  “Teremos mais responsabilidade, teremos que lutar pela moda circular e pela sustentabilidade, pois seremos sugeridos pelo consumidor a tomar rumos mais conscientes” aponta.

“As marcas terão que produzir produtos mais duráveis, e isto será um reflexo de uma exigência do consumidor”, afirma o estilista, lembrando que todo o cenário descrito já corresponde a ruma realidade mas no futuro, tende a evoluir para um dilema sem distorções pois o consumidor será muito mais atento. “O negócio do denim vai mudar, não deverá ter distorções da realidade”, explica.

Questionado sobre como e quando seria retomado o consumo, o designer desenhou um cenário imprevisível. “Honestamente não tenho fórmula, não sei quando o coronavírus vai embora e quando iremos para casa”, desabafou. “Nos Estados Unidos, existem tantas pessoas desempregadas, é um país tão rico que estará habilitado a ajudar as pessoas a continuar”, acrescentou.

Voltando seu olhar para o retorno do consumo de países que já estão numa fase de saída da chamada primeira onda da pandemia, Adriano supõe que o mesmo poderia acontecer com os Estados Unidos e outros países. Porém, tal retomada teria um sentido diferente.

“Na França e na China. as lojas estão cheias de pessoas e provavelmente a ação destas pessoas seja voltar a comprar novamente”, conta o designer, ressaltando que apesar da observação desse comportamento não está totalmente convencido que o mesmo aconteça nos demais países.

“No meu ponto de vista, nos Estados Unidos os consumidores provavelmente vão mudar a abordagem do ato de compra, serão mais maduros, vão mudar as prioridades de suas compras, pois elas serão feitas de forma mais responsável […] Os produtos baratos vão mudar, terão um booming, mas de uma maneira responsável. Terão uma apresentação melhor e a ideia de comprar artigos mais caros deve mudar”, prevê Adriano, destacando que os consumidores vão usar a transparência e a informação para realizar uma compra melhor.

Com tantas direções apontando para a qualidade e para uma escolha de consumo “anti-efêmera”, a questão de um possível declínio – ou mesmo final – da era do fast fashion foi levantada. “Na minha opinião, a moda terá duas possibilidades: em uma delas o comprador será interessado por novos produtos mais emocionais”, explica Adriano, destacando que na sua visão moda será sempre uma compra emocional, estimulada por tal abordagem.

Refletindo sobre a importância das renovações como mote para o mercado, Adriano opinou: “O mercado vai mudar, não precisamos de novos produtos, mas de uma nova abordagem para o que já temos, mais digital, para mudar as regras […] Não dependemos de passarelas, ou editores dependemos dos consumidores: eu preciso ir ao mercado mas não dependo do que ele me mostra”.

“O consumo será mais básico, mais durável e terá mais valor”, explica o designer, enfatizando que na sua visão, o investimento em marketing – este sim poderá mudar e até mesmo tomar relevância maior. Já para o jeans premium, o “mago do denim” defendeu um consumo mais emocional refletindo qualidade, além de exaltar a moda circular e sua evolução não como um diferencial, mas como “parte integrante do novo game”.

O modo como o trabalho remoto poderá afetar o estilo das roupas que compramos e a necessidade de se criar algo novo também foi tópico da entrevista. Apesar das dificuldades impostas pela mudança no seu método de trabalho, Adriano traz uma importante referência quanto a necessidade de se produzir algo novo. “Existem muitas coisas que podem ser feitas em modo digital. O Myr é uma plataforma digital e remota e seguramente está sendo muito importante hoje, sem ela não estaríamos aptos a voltar à normalidade”, explica.

Frisando mais uma vez suas próprias dificuldades, porém inspirando uma reação. “Sinto-me mutilado, pois não tenho conexão com os novos produtos, mas temos que estar prontos para ir para outra estação”, afirma Adriano, sinalizando a importância de se planejar a próxima temporada e sair da inércia. “É preciso tomar cuidado e considerar o produto honestamente. Temos tempo para fazer isso”, explica.

“A Primavera se perdeu totalmente e, provavelmente, muitas companhias tiveram problemas e não estarão prontas para comprar coleções mas poderemos voltar aos negócios. É o que penso, atualmente temos que pensar nos nossos negócios”, conclui.

Incitado um conselho para a indústria da moda denim como um todo, Adriano teve tempo de mencionar o mais importante. “Desejo para todas as pessoas saúde e que tudo passe rapidamente, para que possamos estar aptos a nos ver novamente, para que possamos encontrar uma solução para que os negócios se deem de melhor forma, para todas as pessoas”, declarou.

Fonte: Guia JeansWear 

 

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